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Do desafio dos cinquenta livros à compreensão dos problemas da seca no Nordeste

     
      
    Talvez eu ainda não tenha comentado aqui no blog, mas fui convidada por uma grande amiga a embarcar no desafio dos “50 livros de 1900 para ler antes de morrer” - que você pode conhecer clicando NESTE LINK AQUI.
   O primeiro livro deste desafio foi nada mais nada menos que "Vidas Secas" de Graciliano Ramos. E eu que não sou uma pessoa com grandes dificuldades para ler livros nacionais, resolvi começar por este livro, porque sim, sou bem teimosa.
   Eu havia sido alertada pela minha amiga que "Vidas Secas" era um livro demasiadamente triste, o que tornava-o pesado de ler. E realmente ele é tudo isso e mais um pouco, mas como ando com um temperamento um pouco indiferente, acabei não me sentindo tão fragilizada assim.
   A obra narra a vida de uma família que enfrenta a grande seca do Nordeste. Fabiano, sua esposa "Sinhá Vitória", seus dois filhos e a cachorra Baleia - que tem grande importância nessa história - passam por gigantescas dificuldades, andando diversas léguas à procura de um abrigo. Até que encontram uma casa em uma fazenda abandonada e Fabiano começa a trabalhar para um fazendeiro.
   Não há nenhum momento da história que você possa dizer "que momento feliz e alegre! Eles merecem!", inclusive para aqueles que não tem uma sensibilidade literária, ou seja, os que estão começando a ler livros não conseguem captar as reações nem os sentimentos dos personagens. Pois, a narração, de alguma forma, tenta "adivinhar" o sentimento dos personagens, como se estivesse olhando-os através de uma lente diferenciada.
   Fabiano, o grande "herói" da história, era um homem que não se considerava homem e sim um "bicho", como há diversos trechos em que ele mesmo cita isso. Por esta razão, ele achava que não deveria refletir sobre o que passava e que os filhos talvez nem pensassem em nada, pois se tratavam de "bichos pequenos".
    Dentro daquela família havia sentimentos como as de qualquer outra. Claro que, é uma família que expressa seus sentimentos de uma forma bem distinta, afinal, eles não tinham convivência com praticamente ninguém da cidade e, quando iam até um lugar mais aglomerado, sentiam medo. Um momento extremamente comovente da história foi quando a cadela Baleia - fiel companheira da família - acaba sendo sacrificada por Fabiano, por já estar repleta de machucados e adoentada. Na obra, o autor tenta narrar os sentimentos da cadela, como se ela tivesse uma alma.
   Algo interessante de se comentar é que nesta edição que eu li - infelizmente já entreguei para a biblioteca central e não anotei o nome da editora - continha uma carta de Graciliano que se questionava se realmente os animais tinham alma - que particularmente, acredito que eles têm.
   A forma como eles viviam era extremamente humilde e era visível que os sonhos deles não eram muito grandes. Talvez, eles nem tivessem sonhos. Durante o tempo em que habitaram na casa abandonada, tiveram a oportunidade de viver uma vida mais tranquila, porém viviam sob a ameaça da seca atingir novamente aquela região e eles terem que ir embora para outro lugar.
   No fim da obra, encontramos a família indo embora de sua casa, rumo à cidade, trazendo dentro de si grandes receios e um pouco de esperança para o futuro dos seus filhos. O que podemos perceber é que a história em si não tem um desfecho concreto, se tornando algo semelhante com o cotidiano de muitas pessoas, ou seja, eles estavam indo para a cidade mas não sabiam se eles iriam se adaptar ou não com aquela vida.
   O analfabetismo era algo que atrapalhava muito a vida daquela família. A falta de um vocabulário para expressar o que sentiam, a dificuldade que tinham em entender qual a razão que "Seu Tomás da bolandeira" havia estudado e utilizava um vocabulário tão rico, faz com que a gente reflita que ainda existem pessoas no Brasil que não tem esse conhecimento e não são poucas.
   A obra me provocou diversas reflexões acerca de como as pessoas sofrem grandes dificuldades com a seca. Nós que moramos no Sul, temos um grande problema, pois esquecemos que existem outras partes do Brasil que passam dificuldades deste gênero, às vezes achamos que só nós temos dificuldade. A história me ajudou a ter mais compreensão em relação aos necessitados e entender que até essas pessoas que não sabem sequer ler e escrever têm coisas muito importantes para acrescentar ao mundo.
   Se eu recomendo esta obra? Primeiramente vamos aos requisitos:

  • Já estar acostumado com literatura extremamente triste 
  • Já ter lido algum clássico da literatura brasileira 
  • Estar disposto a aguentar a morte de um cão 
  • Não esperar que a linguagem seja atual ou requintada 
Se você consegue atender pelo menos três destes quatro requisitos, obviamente recomendo esta obra.



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